Uma confissão honesta de um bispo anglicano


Ontem começou uma nova jornada para mim. Não tenho certeza se estou feliz, triste, animado ou melancólico. Suponho, sinto um pouco de tudo isso.

Por um lado, tive o grande privilégio de caminhar com um irmão e amigo até hoje, o bispo Francisco, que tem sido um verdadeiro companheiro de luta, de sonhos e de ilusões.

A igreja da qual hoje sou bispo, surgiu de um sonho de Deus no coração do meu amado amigo. Talvez, ninguém acreditava, contudo este sonho tomou corpo no tempo de Deus. Tenho visto muitos outros tentarem fazer o mesmo caminho e acabar em nada. Não sei os motivos, mas conheço o coração do meu amigo. Tem sofrido, e dado, muito além do que muitos possam imaginar. Ama a Deus e sua igreja, como poucos que eu já vi.

Com certeza, não é perfeito. Acho que ele seria o primeiro em reconhecer isso. Já fez isso. Contudo, cada um de nós somos um projeto nas mãos de Deus. Ele nos está aperfeiçoando dia a dia.

Aprendi muito com o Bispo Francisco, e se é certo que ele não vai embora, também é certo que não se encontra mais no controle do navio. Entretanto, agradeço a Deus que, ainda, vou contar com seus sábios conselhos na caminhada.

Por outro lado, me encontro com a grande responsabilidade de nortear os caminhos da Igreja Anglicana Reformada, juntamente com o Sínodo e a ajuda dos Conselhos.

O trabalho, diante de mim, não é pouco. Cada decisão conta. E dependemos, totalmente, de discernir a voz de Deus e o tempo de Deus. Sobretudo, sendo consciente que somos organizacionalmente uma igreja jovem. Certamente, temos mantido iluminada a flama reformada no Brasil. Temos mostrado nossa dedicação para pregar o evangelho e o compromisso firme de seguir a Jesus Cristo.

Agora, enfrentamos um novo desafio. Preparar a Igreja para avançar firme nos próximos 8 anos com o alvo posto na Visão 20/20. Somente Deus pode fazer isto acontecer, mas não podemos nos esconder atrás destas palavras para não fazer nossa parte.

Faz quatro anos, renasceu a Igreja Anglicana Reformada. Agora, precisamos nutrir, ensinar e orientar a igreja para crescer saudável e forte. Esta é uma grande responsabilidade.

Confesso que, talvez, não esteja pronto para todas as lutas que vamos enfrentar, nem enfrentar os lugares que o caminho nos vai levar. Não temos tudo o que precisamos e, somos poucos, bem poucos. O povo "Anglicano" tem sido malentendido e a identidade dele maltratada. Muitos são os que tem tentado tomar este nome. Muitos mais os que tem prostituído esta igreja, com suas falsas doutrinas e práticas ofensivas. Em meio disto, lembro a situação em que viveu Esdras e as palavras que o povo de Deus respondeu diante da revelação do pecado em meio deles, “Levanta-te, pois a questão está em tuas mãos, e nós o apoiaremos. Tem coragem e age” (Esdras 10.4).

Como bispo, entendo que é tempo de agir em um contexto de grandes conflitos no Cristianismo no século 21. Seremos capazes de enfrentar a batalha diante de nós?

Fico lembrando uma das frases mais inspiradoras do filme, “Coração valente,” William Wallace diz aos soldados reunidos no campo de batalha, “Lutem e talvez morram. Fujam e viverão. Pelo menos por algum tempo. E moribundos nos vossos leitos, daqui a muitos anos, estarão dispostos a trocar todos os dias a partir de hoje por uma chance, apenas por uma chance, de voltarem aqui e dizerem aos nossos inimigos que podem tirar as nossas vidas mas nunca tirarão a nossa liberdade!

Estas palavras nos levam a outras que encontramos no Senhor dos Anéis, “Talvez chegará um dia que a coragem dos homens acabe, que trairemos nossos amigos e quebraremos os laços de confiança, MAS ESSE DIA NÃO É HOJE... HOJE NOS LUTAMOS. Por tudo que amam nessa terra media eu peço que resistam, Homens do Oeste

E, com certeza, estas foram inspiradas pela obra de William Shakespeare,
“O dia de São Crispim: este dia é o da festa de São Crispim; aquele que sobreviver esse dia voltará são e salvo ao seu lar e se colocará na ponta dos pés quando se mencionará esta data, ele crescerá sobre si mesmo ante o nome de São Crispim. Aquele que sobrevier esse dia e chegar a velhice, a cada ano, na véspera desta festa, convidará os amigos e lhes dirá: “Amanhã é São Crispim”. E então, arregaçando as mangas, ao mostrar-lhes as cicatrizes, dirá: “Recebi estas feridas no dia de São Crispim.” 
Os velhos esquecerão; mas, aqueles que não esquecem de tudo, se lembrarão todavia com satisfação das proezas que levaram a cabo naquele dia. [...] 
O bom homem ensinará esta história ao seu filho, e desde este dia até o fim do mundo a festa de São Crispim e Crispiano nunca chegará sem que venha associada a nossa recordação, à lembrança do nosso pequeno exército, do nosso bando de irmãos; porque aquele que verter hoje seu sangue comigo, por muito vil que seja, será meu irmão, esta jornada enobrecerá sua condição e os cavaleiros que permanecem agora no leito da Inglaterra irão se considerar como malditos por não estarem aqui, e sentirão sua nobreza diminuída quando escutarem falar daqueles que combateram conosco no dia de São Crispim.”
O discurso acima, foi proferido por Henrique V, antes da Batalha de Angincourt. O exército de Henrique V, estava em minoria (eram 5 franceses para cada inglês), o terreno favorecia os inimigos franceses, estavam cansados, pois, já haviam andado muito e mesmo assim, venceram porque imaginaram-se na glória. Ganharam porque Henrique soube inspirar seus soldados, e fazê-los acreditar. Esta batalha fez parte da conhecida Guerra dos Cem Anos.

A Igreja se encontra em uma situação similar. Leio, constantemente, palavras de desânimo, cansaço,  desesperança, diante das loucuras que surgem nas igrejas (neo)pentecostais. Pensam, “que fazer?” A resposta é, simplesmente, criticar a Igreja, sem fazer mais.

Também, observo muitos jovens, e não tão jovens, olhando os heróis da fé dos tempos passados. Observam, possivelmente, desejando no seu coração, ser, como aqueles grandes cristãos.

Diante de nós, se encontra a jornada. Seremos capazes de olhar o amanhã com a determinação que, talvez, as futuras gerações notaram aqueles poucos bravos cristãos que lutaram a boa batalha para Cristo?

Uma coisa sei com certeza. As cicatrizes daqueles que lutam, e sofrem, com dignidade e santidade, forçarão uma irmandade de irmãos que farão visível o Reino de Deus no Brasil. Seremos traídos, se não aconteceu já, por homens dados a paixões carnais, desejos infantis, e aspirações de glória. Mas, os verdadeiros heróis, entregarão a vida, por uma causa maior, a glória de Deus, tendo a certeza de que Deus os escolheu para ser parte desta nova nação, chamada IGREJA.

Não sei como a história nos tratará, mas sei que o maior inimigo não se encontra fora de nós, mas em nós mesmos. Se vencemos o pecado, a escuridão e os temores; então, poderemos ter a certeza de que, amanhã, a história será escrita pelo povo de Deus.

Permitam que termine minha confissão com as palavras que escutei no filme, Coach Carter, “O nosso maior medo não é que sejamos inadequados. O nosso maior medo é que sejamos poderosos além da conta. É a nossa luz, não a nossa escuridão, o que mais nos assusta. Os atos insignificantes não servem para mundo. Não há nada esclarecido em se encolher para que os outros à nossa volta não se sintam inseguros. Todos nascemos para brilhar, como fazem as crianças. Não esta só em alguns de nós, está em todos nós. E a medida que deixamos a nossa luz brilhar, inconscientemente, damos permissão para os outros fazerem o mesmo. quando nos libertamos de nossos medos, nossa presença automaticamente liberta os outros.

Que Deus esteja conosco, e seja glorificado através das nossas vidas.

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