Podem as mulheres ser ordenadas pastores?


A questão da ordenação feminina ou, como se fala em certos círculos evangélicos, se as mulheres podem ser pastores, tem causado muito debate no ultimo século. As igrejas pentecostais tiveram desde o seu inicio mulheres que ocuparam lugares de liderança e, recentemente, outras igrejas tem também aceitado a ordenação feminina.

Como anglicano, sempre tenho a tentação de olhar para Inglaterra; não em vão, pois é o nosso referencial histórico do que se conhece hoje como Anglicanismo. Recentemente, a Igreja de Inglaterra está debatendo a permissão da sagração de mulheres ao Episcopado.

Portanto, isso tem reaberto o debate da ordenação feminina. Também foi um tema presente nos corredores da última assembléia de ACNA (Igreja Anglicana na América do Norte), onde a questão da ordenação feminina se encontra, atualmente, nas mãos de cada diocese.

Ninguém pode negar que qualquer denominação tem legalmente o direto de decidir suas normas e formas de agir. O problema é que, como cristãos, não podemos adotar nenhuma decisão que seja contraria as Escrituras. A Bíblia é a última e máxima regra de fé, prática e vida da Igreja.

Os Anglicanos Reformados subscrevemos os 39 Artigos que dizem:
ARTIGO XX – DA AUTORIDADE DA IGREJA
A Igreja tem o poder de decretar Ritos ou Cerimônias, e autoridade nas controvérsias da Fé, todavia não é lícito à Igreja ordenar coisa alguma contrária à Palavra de Deus escrita, nem expor um lugar da Escritura de modo que repugne a outro. Portanto, mesmo a Igreja sendo testemunha e guarda da Escritura Sagrada, todavia, assim como não é lícito decretar coisa alguma contra ela, também não se deve obrigar a que seja adicionada coisa alguma, que nela não se encontra, como necessária para a salvação.
Portanto, a primeira questão deverá ser sempre saber qual é o ensino que encontramos nas Escrituras sobre a questão da ordenação feminina. Sei que os sínodos podem decidir e mudar, legalmente, as doutrinas de uma igreja, mas, em intenções não baseadas nas Escrituras, entra a politicagem dentro da igreja.

Tenho aprendido, nos quase nove anos de Episcopado, o seguinte: se uma pessoa sempre está tentando criar caso nas estruturas para promover seus próprios anseios, sem ter um ministério eficaz, significa que existem áreas morais e éticas fortemente questionáveis que devem ser observadas.

Tem pessoas que desejam poder, protagonismo e títulos. Estas pessoas buscam, através da política eclesiástica, conseguir aquilo que não tem conseguido no trabalho, na comunidade, ou na família. O problema é que não se preocupam com o dano que causam e com a manipulação e mentidas que precisam fazer para conseguir o que desejam.

Agora, vamos as Escrituras.

As Escrituras falam sobre as mulheres tendo diversos dons na igreja (Atos 2.17; 1 Cor. 11:1–16). Portanto, devemos entender que falar do ministério ordenado não deve ser confundido com os dons espirituais ou outros dons. Uma questão são os dons e os ministérios, e outra as ordens (ministério ordenado ou ofícios) e a liderança.

Possivelmente, um erro tem sido causado pelos batistas e outras igrejas evangélicas, quando começaram a chamar de pastores os presbíteros e líderes das congregações. Nas Escrituras, ser pastor é um dom, não um ministério ordenado. Em outras palavras, o pastor é uma das funções que devem ser desempenhadas pelos bispos, presbíteros e diáconos, mas existem leigos (membros da igreja) que podem ter um dom de cuidar das pessoas e, nesse sentido, podem ser considerados “pastores.”

Quando confundimos dons ministeriais e ministério ordenado, então podemos ter certeza de que vamos ter um problema, logo, logo. Portanto, não confundamos o ser um presbítero (líder de uma congregação local) com o ser um pastor (um dom de cuidar e nutrir as pessoas).

O fato interessante é que não encontramos nenhum texto direto a favor da ordenação feminina, nem nenhum caso que uma mulher fosse líder da igreja local no Novo Testamento. Contudo, encontramos textos que mostram as mulheres não ensinar ou ter autoridade sobre o homem (1 Timóteo 2.11-14). Ensinar e autoridade são claramente funções do ministério ordenado.

Outros textos bíblicos (1 Coríntios 14.34-38; 1 Timóteo 3; Tito 1.5-7; 1 Coríntios 11.3) devem ser considerados nesta explanação.

Evidentemente, estes textos bíblicos não significam que as mulheres não podem falar dentro do prédio da igreja. Isto seria uma interpretação absurda, mas está ensinando um principio bíblico de ensino e autoridade para a Igreja.

Encontramos evidências de que existia uma ordem de diaconisas na Igreja do NT, mas esta deve ser considerada à luz do serviço e ministério, e não à luz do ensino e autoridade. Observamos que as Escrituras não mostram, em nenhum momento, presbítero ou bispo algum que fosse mulher. Tampouco, existem mulheres apóstolos. Sobre Júnias, devemos de considerar que existe um forte debate sobre se ter sido ou não um nome feminino. Os pais da igreja tinham diversas opiniões; por exemplo, João Crisostomo pensou que era um nome feminino, mas Orígenes e Epifanius tinham a opinião contraria.

Por outro lado, o termo “apóstolo” pode ser usado para referir-se a um dos doze, uma pessoa enviada, um dom ministerial ou um falso mestre. Nem todos os apóstolos mencionados no Novo Testamento tinham a autoridade apostólica que os doze e Paulo receberam.

Evidentemente, esta questão precisa de um espaço maior do que temos aqui, por isso será bom refletir em futuros artigos ou produzir uma obra maior a respeito desta questão.

Talvez você esteja ainda refletindo, mas temos Gálatas 3.28. Se lemos cuidadosamente o contexto deste texto, observamos que o mesmo não se refere as ordens, mas a salvação e a ser parte do corpo de Cristo. Na Igreja, todos entramos pela mesma porta, contudo isso não significa que todos tenhamos as mesmas ordens ou ofícios nela.

Existe outra questão a ser considerada. Esta é secundaria a autoridade das Escrituras, mas nos ajudará a entender como a Igreja dos primeiros séculos tem visto esta questão.

Quando lemos os Pais da Igreja nos encontramos que eles acreditavam que as mulheres tinham um papel importante na vida da Igreja, mas não ordenavam as mesmas.

Inclusive se chagamos a conclusão de que possa existir certa ambigüidade no Novo Testamento (o qual não acredito, mas uso esta premissa para enfatizar um ponto), então o testemunho dos cânones, concílios e opiniões dos Pais da Igreja e o consenso dos primeiros cinco séculos é claro e sem erros. Nós, Anglicanos, escutamos os Pais da igreja primitiva, sempre, e só é diferente caso sejam contrários as Escrituras.

Os Pais da igreja (Irenaeus, Tertuliano, Hippolytus, Firmiliano, Epifanio de Salamis, entre outros) rejeitaram a idéia da ordenação feminina, não porque era incompatível com a cultura da época, mas porque era incompatível com a fé Cristã.

Portanto, se observamos que a Igreja, as nações e os povos, através do tempo, tem mantido uma mesma posição sobre esta questão e, ao mesmo tempo, não encontramos nenhuma evidência clara nas Escrituras sobre a ordenação feminina, então devo entender que a mudança nas igrejas em relação a essa questão, é, evidentemente, uma influência cultural e social.

Isto quer dizer, em outras palavras, que o problema cultural é atual, dos dias de hoje, e não, como dizem os teólogos liberais, uma questão cultural da época.

Os Anglicanos Reformados entendem que não existe base bíblica, nem histórica, a favor da ordenação feminina. Nos preocupa a facilidade com que as igrejas se adaptam as questões temporais da sociedade e as pressões deste mundo.

Oro para que a Igreja encontre novamente uma paixão pelas verdades eternas das Escrituras e amor pelas pessoas que ainda não conhecem a Jesus Cristo, como Senhor e Salvador.

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